A dislipidemia, uma alteração nos níveis de gorduras no sangue, como o colesterol e os triglicerídeos, é uma condição silenciosa, mas que representa um importante fator de risco para doenças cardiovasculares. Mesmo sem causar sintomas aparentes, ela contribui diretamente para a formação de placas de gordura nas artérias, processo conhecido como aterosclerose, que pode levar a infartos, acidentes vasculares cerebrais (AVC) e morte súbita. O risco cresce com o tempo, mas a boa notícia é que há tratamento eficaz. Para surtir efeito, no entanto, ele precisa ser realizado de forma contínua e bem orientada, com base em informação confiável e afastado de mitos infundados que ainda circulam, inclusive entre profissionais da saúde.
O colesterol LDL, conhecido como “colesterol ruim”, é o principal alvo do tratamento. Diversos estudos mostram que sua redução diminui significativamente a chance de eventos cardiovasculares maiores. Diretrizes atualizadas de entidades como a Sociedade Brasileira de Cardiologia e o American College of Cardiology reforçam a importância do uso de medicamentos redutores de colesterol, como as estatinas. Essas medicações estão entre as mais estudadas do mundo e, segundo evidências recentes, são eficazes e seguras para a maioria das pessoas.
Apesar dos benefícios comprovados, muitas pessoas têm receio de iniciar ou continuar o tratamento, por conta de informações equivocadas. As queixas mais comuns referem-se a dores musculares, desconfortos gastrointestinais ou alterações hepáticas. Porém, estudos recentes indicam que grande parte desses sintomas está ligada ao chamado efeito placebo, ou seja, quando a pessoa sente um efeito negativo apenas por acreditar que ele vai acontecer. Um exemplo claro disso vem do estudo SAMSON, da Universidade de Oxford, divulgado em 2020, no qual cerca de 90% dos efeitos colaterais relatados durante o uso da estatina também apareceram quando os participantes tomaram placebo, ou seja, um comprimido sem princípio ativo.
Casos de efeitos adversos reais, como alterações hepáticas importantes, rabdomiólise ou miopatia grave, são extremamente raros. Há ainda quem tema que o colesterol fique “baixo demais”. Uma pesquisa recente levantou a possibilidade de aumento do risco de catarata em pacientes com LDL abaixo de 25 mg/dL, mas os dados ainda são preliminares, e a incidência observada foi pequena. O mais importante a considerar é que o risco de eventos cardiovasculares graves é muito maior do que qualquer efeito adverso raro.
Infelizmente, muitos mitos sobre o uso das estatinas ainda estão presentes, como a ideia de que causam perda de memória, disfunção erétil, neoplasias ou alterações comportamentais. Até o momento, nenhuma dessas associações foi confirmada por estudos sérios e bem conduzidos.
Em resumo, tratar a dislipidemia corretamente e de forma contínua é uma estratégia eficaz e segura para prevenir doenças graves e melhorar a qualidade de vida a longo prazo.
Luís Alberto Andrade Bueno
CRM 128.529 / RQE 36.248
Formado em medicina em 2007 pela Universidade de Ribeirão Preto (UNAERP); Especializações: Clínica Médica na Universidade Estadual de Londrina (UEL) e Cardiologia pela Universidade Estadual de Londrina (UEL); Título de Especialista em Cardiologia pela Sociedade Brasileira de Cardiologia.
*Texto sob responsabilidade do autor